Raw x JPG: Mitos e verdades, parte III

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Artigo revisto e atualizado em 31/08/2018

E o RAW?

Ahhh, chegamos ao que interessa! "RAW" é um termo genérico que representa toda uma categoria de arquivos, não é exatamente um formato. Também não é uma sigla, significa apenas a palavra "cru" em inglês. Ele surge na área médica em meados dos anos 80, equipando os primeiros aparelhos digitais de ressonância, tomografia e outros. Sua principal função era garantir a segurança e inviolabilidade dos arquivos, fazendo com que os exames não pudessem ser alterados após a sua realização.

Além disso, sua capacidade de gravar metadados (inúmeras informações adicionais sobre a imagem e o equipamento utilizado), que também são invioláveis, aumentava ainda mais sua segurança. Mas ele não "nasceu" como um formato fechado e definido, e cada fabricante é livre para criar seus próprios padrões até hoje, o que causa uma série de contratempos.

Mas seu caráter de arquivo inviolável e espaço para metadados se mostrou excelente para a fotografia, e logo o RAW foi elevado ao status de "filme digital". Como um arquivo RAW não pode ser alterado e regravado sobre si mesmo (como acontece com os outros formatos), o arquivo mantém suas características originais indefinidamente, exatamente como o filme! Perfeito!

Mas nem tudo são flores. Cada fabricante adota um formato diferente para seu RAW, e isso sim, podemos chamar de "formato de arquivo". Porém, eles são totalmente incompatíveis entre si, e até mesmo equipamentos de um mesmo fabricante possuem sub-formatos exclusivos, pois o RAW consegue abarcar novas tecnologias facilmente. Essa diversidade de formatos cria a necessidade de um pré-processamento da imagem em RAW antes de ser editada em sistemas comerciais, como o Photoshop. Ou seja, um arquivo RAW precisa ser "traduzido" por um sistema especializado, antes de ser efetivamente editado e greavado em um formato mais popular, como o JPG ou o TIFF. Alguns formatos atuais de arquivos RAW são: NEF (Nikon), CRW/CR2 (Canon), SRW/ARW/SR2/SRI (Sony), PEF (Pentax), SRW (Samsung), RAF (Fuji), etc.

Profundidade de cor do RAW

Esse é o ponto principal. Já sabemos que o JPG comporta apenas 8 bits por canal de cor, certo? E vimos que isso é muito pouco para resolver necessidades técnicas de uma fotografia. Afinal, nosso melhor parâmetro é a excelente qualidade que a fotografia química tradicional já havia atingido com o filme, e infelizmente, o JPG está absurdamente distante disso com seus míseros 256 níveis de tonalidade por canal de cor.

Pois bem, o RAW possui um trunfo extra, que eu considero seu melhor recurso: ele não está limitado à terrível limitação dos 8 bits. Dependendo do equipamento, seu byte pode conter 12, 14 ou 16 bits. A diferença no número de cores possíveis em cada canal é brutal, e o resultado na imagem é surpreendente. Veja este comparativo:

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Assim fica fácil entender que o RAW permite o aproveitamento máximo do sensor da câmera, que é projetado para ter sua melhor performance neste modo! Tons sutis, tons de pele, degradées, áreas de luz complicada, amplitude tonal, alcance dinâmico, enfim, tudo fica infinitamente superior com a resposta de cores do RAW, pois seu espaço de armazenamento binário é bem maior. Em contrapartida, seus arquivos são também muito maiores, pois a compressão utilizada é do tipo "Lossless" ("sem perdas"), que consegue comprimir os dados sem perder nenhuma informação de cor. O consumo de espaço de armazenamento é voraz, e isso deve ser levado em conta, pois exigirá cartões de memória maiores, bem como discos rígidos, backups, processadores e memórias de trabalho também maiores e melhores.

Curiosidade: Tudo é RAW

Todos os sensores "digitais" (entre aspas sim, pois eles não são exatamente "digitais") geram RAW, mesmo nas câmeras mais baratas e celulares. RAW é o resultado da conversão "luz > eletricidade > bits" crua e direta da imagem sobre o sensor, sem nenhum tipo de processamento adicional. Mas apenas as câmeras mais sofisticadas, como as DSLR, e algumas outras raras câmeras compactas ou celulares permitem gravar este arquivo. Na verdade, o RAW se refere á leitura nativa de qualquer sensor digital. O JPG é o resultado dessa captura após o processamento interno feito pela própria câmera, onde as cores são comprimidas (ou "perdidas"...) e eventualmente algum efeito é aplicado (brilho, contraste, saturação, preto-e-branco, sépia, etc).

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Sensor full-frame da Nikon D610


A conversão e o formato TIFF

Por não ser padronizado, o RAW precisa de uma conversão antes de ser tratado e gravado em outro formato. Essa é a tarefa de programas como o Adobe Camera Raw (também presente no Adobe Lightroom), entre muitos outros editores/conversores (DxO PhotoLab, Alien Skin Exposure, etc), feitos para decodificar os formatos próprios de cada modelo de câmera e converter para algo padronizado.

Após a "revelação" e edição de um arquivo RAW, o formato mais recomendável para a gravação final seria o TIFF (Tagged Image Files), que por suportar bytes de até 32 bits por canal, consegue manter toda a qualidade original do RAW sem nenhuma degradação na imagem. Porém, a sua grande fome de espaço de armazenamento é seu maior problema. O TIFF é um formato onde tipicamente não se usa compressão alguma (embora seja possível). Os arquivos finais sempre são muito grandes e pesados. É o preço que se paga pela qualidade máxima, mas dependendo da aplicação (Fine Art, preto-e-branco, livros fotográficos, exposições, galerias), ele se torna imprescindível. A propósito, muitos formatos de arquivos RAW de diversos fabricantes são baseados na estrutura interna do arquivo TIFF!!!

Gravar o arquivo final em JPG após a edição de um RAW também é possível, claro, mas esteja ciente da severa perda de cores provocada pela redução de 16, 14 ou 12 bits para apenas 8 bits. Apesar disso, os resultados ainda são melhores do que os JPG nativos gerados pela câmera. Em trabalhos volumosos o JPG detém vantagens por conta da sua economia de espaço.

A encrenca do Preto-e-Branco

A briga entre JPG e RAW fica ainda mais crítica no PB. Para formar tons de cinza, os sistemas digitais mantém o mesmo valor em cada um dos 3 canais RGB, limitando a variação de tonalidades ao limite que for determinado pelo tamanho do byte de um único canal de cor. Assim, o JPG só consegue gravar (pasmem!) míseros 256 níveis de cinza, pois comporta apenas 8 bits!!! Terrível, não? Imagine aquela sua foto magnifica em PB com um número tão reduzido de tons! Triste verdade, mas é exatamente isso que acontece. O PB digital em JPG não chega nem ao dedão do pé do PB do RAW, muito menos dos filmes. Já a combinação RAW + TIFF consegue gerar imagens PB com 4.096 (12 bits), 16.384 (14 bits) ou 65.536 (16 bits) níveis de cinza. Aí, sim, o patamar é outro! Há tempos venho usando exclusivamente RAW + TIFF para gerar minhas imagens e prints em Preto-e-Branco, e não abro mão disso!

Quer saber mais sobre fotografia digital em PRETO-E-BRANCO? Veja aqui!

Prós e Contras

Cada tipo de arquivo tem seus entraves e vantagens. Vamos ver alguns deles:

JPEG

Prós

  • Arquivos pequenos e portáveis entre plataformas diferentes
  • Edição rápida
  • Pouco consumo de recursos para armazenamento e back-up
  • Velocidade máxima da câmera em modos de disparos contínuos
  • Gera arquivos prontos
  • Usa ajustes da câmera para pré-processamento interno (brilho, contraste, etc)
  • Baixa exigência dos sistemas de edição (memória, processador)

Contras

  • Compressão altamente destrutiva
  • Armazenamento em apenas 8 bits
  • Baixas possibilidades de edição posterior
  • Banding
  • Compressão progressiva (a cada regravação, nova compressão é aplicada)
  • Insuficiente para aplicaçoes profisionais exigentes
  • Maior consumo da bateria, provocado pelo processamento interno adicional (acreditem, já testei isso na prática! O gasto adicional foi de quase 20%. Claro que não é científico, mas pude comprovar em minha Nikon D800. De qualquer forma, não aceitem como fato, apenas como uma provável curiosidade.)

RAW

Prós

  • Limte máximo de qualidade da câmera
  • Menor consumo da bateria
  • Plena capacidade de edição posterior e eventuais correções
  • Redefinição da fotometria na edição em até 5 pontos acima ou abaixo, dependendo da câmera
  • Funcionalidades de nível profissional
  • Alto nível de resposta de cor e latitude de exposição

Contras

  • Maior consumo de recursos de armazenamento e back-up
  • Grande exigência dos sistemas de edição (memória, processador)
  • Diminuição da velocidade da câmera em modos de disparo contínuo
  • Diminuição do buffer de memória da câmera em modos de disparo contínuo
  • Exigência de cartões rápidos e espaçosos
  • Maior tempo exigido no tratamento
  • Menor produtividade em trabalhos simples e corriqueiros ou volumosos

Minha opinião...

Há muito mais a ser dito, mas seria inevitável entrar em detalhes pra lá de técnicos, acreditem! Acho que não vem ao caso, assim como também não acho que eu conseguiria diminuir a "complexidade" de textos sobre assuntos mais profundos, por mais que os conheça ou goste do tema! Mas já deu pra entender que o RAW é o único tipo de arquivo que garante a total qualidade nas câmeras digitais atuais, e que o JPG está bastante distante da qualidade necessária à boa fotografia, em níveis mais altos de exigência, no que se refere à finalização e apresentação.

Afinal, se os mestres do passado chegaram tão longe com o filme, porque nós devemos regredir e jogar tudo no lixo? Eu, por motivos práticos e filosóficos, me recuso a cometer tal afronta e uso apenas o RAW em 100% das minhas criações autorais. Já nos trabalhos contratados, depende da situação, mas ainda opto pelo RAW em praticamente 90% dos casos.

E sobre os conhecimentos do universo digital, considero o seguinte: se os antigos mestres sacavam muito sobre químicas, processos e revelações, devemos fazer o mesmo com nosso novo "material de trabalho", os bits e bytes. Para um profissional ou diletante mais avançado, dominar o assunto é mais do que obrigação. Simples assim.

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Menus da Nikon e Canon onde se configura a escolha do tipo de arquivo a ser gerado.

Um ponto importante da imagem em RAW é sua necessidade de ser processada, ou "revelada", resgatando um pouquinho das mais interessantes e míticas características da fotografia em filme. Cada foto RAW precisa ser revelada digitalmente, em um processo que traz correlações com a aura que envolvia a fotografia do passado. Porém, isso consome tempo, que precisa ser equacionado em um trabalho profissional. Mas isso traz também uma enorme capacidade de correção de erros e problemas, resolvendo situações impossíveis de serem corrigidas no JPG.

Mas, por outro lado, tenho que concordar: o JPG se mostra excelente quando o assunto é velocidade, armazenamento e transporte de imagens pelo mundo virtual, pois seus arquivos são pequenos. Se não houver a necessidade da máxima qualidade, é claro que o JPG resolve. Cabe então ao fotógrafo efetuar a sua escolha pessoal, adotando o formato que mais convier à sua fotografia. Certos mercados, como o de Fine Art e o gráfico , ganham muito com o uso do RAW. Outros, como o fotojornalismo ou o registro corriqueiro de eventos sociais, podem se beneficiar do JPG por causa da quantidade de imagens produzidas ou da necessária agilidade para publicação, apesar do formato oferecer menos recursos para correção de problemas fotográficos (má fotometria, foco ruim, lentes medianas, etc). A escolha é totalmente sua, e deve ser baseada nas suas necessidades e capacidades técnicas.

Em tempo: Lembre-se de que a diferença de tamanho das imagens entre estes formatos é gritante! Considere a aquisição de back-ups e cartões de memória maiores e mais rápidos caso opte pelo RAW + TIFF. Aqui no estúdio tenho dezenas de HDs de backup já lotados contendo muitos terabytes de arquivos. Mas no final das contas, compensa, e muito.

Espero que este artigo lhe seja útil! Paz e boas fotos!

Hudson Malta

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